Jurisprudência: APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE DE ATO JURÍDICO

Dados do acórdão

Classe:

Apelação Cível

Processo:

Relator:

Fernando Carioni

Data:

2008-01-28

Apelação Cível n. , da Capital

Relator: Des. Fernando Carioni

APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE DE ATO JURÍDICO CUMULADA COM INDENIZATÓRIA – ATA DE ASSEMBLÉIA GERAL DE CONDOMÍNIO – APROVAÇÃO DE DESPESAS EFETUADAS SEM COMPROVAÇÃO – VÍCIO DE CONSENTIMENTO – DOLO – ANULAÇÃO DEVIDA – EXEGESE DO ART. 147, II, DO ANTIGO CÓDIGO CIVIL – SENTENÇA MANTIDA – RECURSO DESPROVIDO

A teor do artigo 147, II, do antigo Código Civil, “é anulável o ato jurídico por vício resultante de erro, dolo, coação, simulação, ou fraude (arts. 86 a 113)” .

No dolo, a vítima é ludibriada pelo agente e emite sua vontade de forma viciada, baseada em fatos não condizentes com a realidade.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. , da comarca da Capital (6ª Vara Cível), em que é apelante Aparecido Darcy Bordin, e apelado Condomínio Edifício Cezanne:

ACORDAM, em Terceira Câmara de Direito Civil, por votação unânime, negar provimento ao recurso. Custas legais.

RELATÓRIO

Condomínio Edifício Cezanne ajuizou ação ordinária declaratória de nulidade de ato jurídico cumulada com indenizatória contra Aparecido Darcy Bordin, relatando que o condomínio foi administrado pelo réu, na função de síndico, no período de 28-7-1998 a 15-11-1993. Acrescentou que o período em que o réu funcionou como síndico foi marcado por desmandos administrativos, dos quais ele se omitiu e agiu de forma contrária ao disposto na Convenção e no Regimento Interno do condomínio.

Informou que o requerido omitiu-se no que se refere ao desvio de finalidade de unidade habitacional para comercial; jamais levou ao Conselho Consultivo pedido de autorização de despesas; apresentou balancetes apócrifos e sem a devida comprovação; fez telefonemas pessoais para o exterior e os apresentou como despesas do condomínio; efetuou compras exageradas de material para escritório; utilizou a verba do condomínio para pagar despesas pessoais; apresentou atas avulsas, sem nenhuma assinatura; falsificou atas; não pagou rateios; e não publicava com a antecedência prevista em lei a convocação para as Assembléias-Gerais, e que, quando o fazia, não especificava o objetivo.

Afirmou que as contas do reú nunca foram prestadas ou aprovadas. Acrescentou que ele jamais forneceu ao Conselho Consultivo nenhuma documentação probatória das despesas apresentadas e pagas, razão pela qual os condôminos o destituíram do cargo de síndico e anularam as “falsas deliberações” constantes na ata datada de 13-11-1992.

A par desses fatos, requereu fossem declaradas nulas as deliberações da Assembléia-Geral realizada no dia 13-11-1992 (doc. 3H), referentes à aprovação das contas apresentadas pelo réu no exercício da sindicatura do condomínio, assim como os balancetes (doc. 4B), já que desprovidos de respectiva comprovação dos valores ali consignados. Por conseguinte, pleiteou a aprovação das contas constantes no documento 12A/B/C elaboradas pela empresa Audicon, com a condenação do requerido à devolução do valor constante no relatório, no importe, atualizado, de R$ 24.098,56 (vinte e quatro mil noventa e oito reais e cinqüenta e seis centavos).

Juntou documentos (fls. 17 a 212).

Citado, Aparecido Darcy Bordin ofertou contestação sustentando, em síntese, ter sempre agido em conformidade com a lei e as normas que regem o condomínio. Acrescentou que suas prestações de contas foram sempre aprovadas pelos condôminos presentes as reuniões.

Na mesma oportunidade, o requerido ofereceu reconvenção, na qual alegou que não recebeu a remuneração pelos serviços prestados ao condomínio reconvindo, relativa aos meses de outubro e novembro de 1993, bem como 13º salário do mesmo ano, razão pela qual pleiteou a condenação do autor reconvindo ao pagamento de R$ 583,33 (quinhentos e oitenta e três reais e trinta e três centavos).

Instruído o feito, com a realização de prova pericial, sobreveio sentença na qual o Magistrado a quo julgou parcialmente procedente o pedido exordial para declarar nula a disposição assemblear que aprovou as contas ditas como prestadas pelo requerido, condenando-o à devolução do valor indevidamente desviado (R$ 7.933,55), bem como julgou improcedente a reconvenção (fls. 663 e 664).

Inconformado, Aparecido Darcy Bordin interpôs recurso de apelação sustentando que a assembléia que não aprovou as contas é datada de 13-11-1991, portanto referente à gestão do ano de 1990/1991. Acrescenta que foi síndico do condomínio apelado por duas gestões, e que sua recondução prova de que sua gestão foi eficiente e responsável.

Alega que não tinha obrigação de portar os recibos comprovantes referentes a sua última gestão, pois, de acordo com o art. 22, § 1º, g, da Lei n. 4.591/64, compete ao síndico manter guardado pelo prazo de 5 (cinco) anos toda a documentação relativa ao condomínio.

Assevera que não pode aceitar que balancetes aprovados em assembléia venham a ser questionados por perícia efetuada com base em documentos anexados pelo próprio apelado.

Por fim, salienta ser ilegal sua condenação, tendo em vista que a ação foi proposta posteriormente ao prazo legal obrigacional de manutenção dos documentos que comprovariam a correta aplicação dos recursos condominiais.

Em contra-razões, o apelado requer a manutenção da decisão objurgada.

VOTO

A presente inconformação tem por objeto a sentença de primeiro grau que, julgando parcialmente procedente a ação ordinária declaratória de nulidade de ato jurídico cumulada com indenizatória, proposta pelo Condomínio Edifício Cezanne contra Aparecido Darcy Bordin, declarou nula a disposição assemblear que aprovou as contas ditas como prestadas pelo requerido, condenando-o à devolução do valor indevidamente desviado, no importe de R$
(sete mil novecentos e trinta e três reais e cinqüenta e cinco centavos).

Busca o condomínio apelado a declaração de nulidade das deliberações da assembléia-geral realizada no dia 13-11-1992, no qual foram prestadas e aprovadas as contas do período de 14-11-1991 a 13-11-1992, ao fundamento de que as despesas aprovadas pela assembléia não foram devidamente comprovadas pelo então síndico, Aparecido Darcy Bordin, ora apelante.

Pretende também o apelado a devolução dos valores relativos às despesas não comprovadas pelo síndico.

Realizada perícia contábil, constatou-se a existência de gastos efetuados na gestão do apelante sem a devida comprovação; a existência de gastos desconexos com a finalidade do condomínio; e a compra de bens para uso próprio do apelante com a verba do condomínio (fls. 381 a 382).

A par disso, o perito judicial apurou um saldo a ser devolvido pelo apelante ao condomínio no importe de R$ 7.933,55 (sete mil novecentos e trinta e três reais e cinqüenta e cinco centavos)

Por tal motivo, é nítido que a aprovação das contas, na Assembléia-Geral realizada no dia 13-11-1992 se deu de forma dolosa, pois foram aprovadas sem que o síndico apresentasse a comprovação das despesas por ele realizadas.

É consabido que a vontade viciada implica na anulabilidade do ato realizado.

Dispõe o art. 147, II, do antigo Código Civil, vigente a época dos fatos, que “é anulável o ato jurídico por vício resultante de erro, dolo, coação, simulação, ou fraude (arts. 86 a 113)”.

Os vícios de consentimento enumerados no referido dispositivo devem provocar uma manifestação de vontade que não corresponde ao verdadeiro desejo dos declarantes e enseja a anulação do ato celebrado.

Sobre eles, colhe-se da jurisprudência:

Erro, dolo e simulação são vícios de vontade que segundo o Código Civil de 1916 (vigente à época dos fatos) tornam anulável o negócio jurídico. Não se confundem. No erro, a vítima se engana sozinha; no dolo, ela é ludibriada pelo outro contratante ou por terceiro; e na simulação, ambos os contratantes agem para iludir terceiro (TJSC, AC n. , de Laguna, rel. Des. Jaime Ramos, j. em 12-4-2005).

A respeito do dolo, Sílvio de Salvo Venosa destaca que “o dolo induz o declaratário, isto é, o destinatário da manifestação de vontade, a erro, mas erro provocado pela conduta do declarante. O erro participa do conceito de dolo nas é por ele absorvido” (Direito civil: parte geral, 6 ed., São Paulo, Atlas, 2006, p. 415).

Adiante, afirma o insigne doutrinador que “o elemento básico do negócio jurídico é a vontade. Para que essa vontade seja apta a preencher o conceito de um negócio jurídico, necessita brotar isenta de qualquer induzimento malicioso. Deve ser espontânea. Quando há perda dessa espontaneidade, o negócio está viciado. O induzimento malicioso, o dolo, é uma das causas viciadoras do negócio” (obra citada, p. 416 e 417).

A par disso, conclui-se que no dolo a vítima é ludibriada pelo agente e emite sua vontade de forma viciada embasada em fatos não condizentes com a realidade.

Pela análise do conjunto de provas, indiscutível que Aparecido Darcy Brodin dolosamente influenciou a vontade dos demais condôminos a aprovar as contas do período de novembro de 1991 a novembro de 1992, tendo em vista, conforme apurado pela perícia judicial, que várias despesas efetuadas nesse interregno não foram comprovadas pelo síndico.

Dessa feita, correta a decisão que declarou nula a disposição da assembléia que aprovou as contas ditas como prestadas pelo apelante, todavia, por fundamento diverso, já que na sentença a quo o Magistrado reconheceu a existência de simulação.

Outrossim, não merece prosperar a alegação do apelante de que a ação teria sido proposta posteriormente ao prazo legal obrigacional de manutenção dos documentos que comprovariam a correta aplicação dos recursos do condomínio.

De fato, a Lei n. 4.591/64, em seu art. 22, § 1º, alínea g, determina que “compete ao síndico manter guardada durante o prazo de cinco anos para eventuais necessidade de verificação contábil, toda a documentação relativa ao condomínio”.

Todavia, a ação foi proposta em maio de 1995, enquanto as despesas efetuadas sem comprovação, bem como aquelas efetuadas em proveito pessoal do síndico ou computadas a mais, são relativas ao período compreendido entre junho de 1990 e outubro de 1993, portanto, dentro prazo qüinqüenal a que se refere a Lei n. 4.591/64.

Ante o exposto, nega-se provimento ao recurso, mantendo-se incólume a sentença objurgada.

DECISÃO

Nos termos do voto do Relator, nega-se provimento ao recurso.

Participaram do julgamento, realizado no dia 13 de novembro de 2007, com votos vencedores, os Exmos. Srs. Des. Marcus Tulio Sartorato e Henry Petry Junior.

Florianópolis, 26 de novembro de 2007.

Fernando Carioni

PRESIDENTE E RELATOR

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